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Uma semana (quase) sem internet: minha experiência em Cuba

Royal Society for Public Health (RSPH), uma instituição britânica sem fins lucrativos, divulgou uma campanha para o mês de Setembro chamada, Scroll Free September. O objetivo é reduzir o acesso das mídias sociais nos 30 dias do mês e estimular uma rotina menos online, principalmente para crianças e jovens, cada dia mais dependentes de aplicativos e likes.

A instituição afirma que, há estudos comprovando que a população mundial está adoecendo e, o maior causador de doenças como, depressão, insônia, baixa autoestima e ansiedade, está no uso excessivo das mídias sociais.

Logo que vi a reportagem, pensei que não seria possível para mim ficar 30 dias offline, mas passei a refletir sobre o assunto e me senti tentada a reduzir pelo menos o consumo diário. Preciso admitir que inicialmente não tive muito sucesso, usei o hábito e o trabalho como desculpas, para não ficar longe do smartphone.

Cerca de duas semanas depois que vi a reportagem, entrei de férias, ou melhor, mini férias. Como o destino era Cuba, país onde há uma série de restrições, pensei, lá será um bom lugar para teste.

Sempre que visito uma cidade ou país, estudo antes sua história, cultura, vejo documentários, de forma que ao chegar esteja ciente do que me espera. Em se tratando de Cuba, de nada adiantou.

Chegando em Havana, a primeira impressão foi o choque cultural e principalmente de época, porque no lugar de avião, tive a impressão de ter viajado em uma máquina do tempo que me levou para o ano de 1950. Fiquei meio paralisada, assustada, do quanto o país vivia uma realidade de décadas atrás em pleno século XXI.

A maioria dos veículos são a-n-t-i-g-o-s, carros, ônibus e caminhões, todos circulando normalmente trazem uma mistura de nostalgia e charme para quem visita o país. O preço médio de um carro popular novo é de CUC 60 mil, cerca de R$ 300 mil, isso mesmo, trezentos mil reais. Os carros antigos aproximadamente CUC 20 mil, R$ 100 mil. Depois de saber os valores, entendi o porquê de tantos carros antigos pela cidade.

Fora a parte turística que é muito bonita e um pouco conservada, a cidade de uma maneira geral tem suas ruas sujas, passeios esburacados, prédios desmoronados, casas com sua estrutura comprometida e mercados com prateleiras quase vazias. Aos poucos, o país tenta sobreviver à crise gerada pelo embargo iniciado em 1960, pelos Estados Unidos.

Mesmo com tanta pobreza, o índice de criminalidade é de dar inveja. As pessoas são encantadoras, cada uma com sua história de vida, a maioria faz faculdade ou já tem graduação e todos que conheci, falavam inglês. Cubanos em média vivem com CUC 10, cerca de R$ 50,00, por mês, acredite. De uma forma geral sabem que ganham pouco, mas celebram quando tem um trabalho. Não sei qual a veracidade da informação, mas para alguns que perguntei informaram que o governo apesar de toda crise, oferece moradia, saúde, educação e em caso de desemprego, ainda ajuda na alimentação da família. Conheci gente honesta, atenciosa e que tem orgulho do seu país (não da situação política, muito menos da econômica).

Falar em orgulho, a bandeira está presente em tudo, hasteada em frente as casas, em monumentos, paredes. Tudo é motivo para usar as cores da nação. Nunca conheci um país tão pobre e sofrido e ao mesmo tempo tão orgulhoso da sua história, música e cultura. Sobre Fidel e Che, é uma mistura de amor e ódio, alguns apoiam a revolução, outros a condenam. Sobre este tema vou ficando por aqui, falarei mais em outro texto.

Para esse povo ‘viver sem internet’ não é um problema. Perguntei para alguns deles como conseguiam e sempre tinha a resposta: “Si no tengo, no me hace falta”. Dava gosto de ver as pessoas nas portas de suas casas conversando, ouvindo música, crianças brincando de amarelinha e, nesse clima, fui me acostumando com a realidade de uma rotina (quase) sem internet.

Nos primeiros dias ficava preocupada em dar notícias para família, queria contar o que estava vivendo, mas ao mesmo tempo, fiquei tentada a aproveitar um momento que poderia ser único. Afinal, no Brasil, apesar de não ter uma das melhores conexões de internet, temos acesso em quase todo país.

Fui aproveitando os dias caminhando pelas ruas estreitas de Habana Vieja, conheci Viñales e Playas del Este (lindíssimas por sinal). O calor era bem familiar, ar condicionado um artigo de luxo e para refrescar, água gelada e sorvete de chocolate!

Quando o assunto é telecomunicação, só existe uma empresa, ETECSA. Na prática, a internet em Cuba é restrita a poucos pontos onde pode-se conectar e não é gratuita. No Brasil e em outros lugares do mundo, utilizamos o serviço gratuitamente em restaurantes, hotéis e cafés. Em Havana, nesses lugares, geralmente possuem um roteador de wi-fi, que com um cartão de internet, colocando login e senha no celular, é possível acessar por 1 hora no valor de CUC 1,50 (cerca de R$ 7,50), durante 30 dias. A conexão não é nada boa, consegue-se no máximo por 10 minutos, depois cai e nem adianta insistir porque não volta o acesso.

Como precisava dar notícias, comprei uma tarjeta de navegación, por saber da dificuldade e lentidão, escrevia as mensagens pelo whatsapp enquanto off-line e quando conseguia conexão, elas eram enviadas ao mesmo tempo que recebia as mensagens dos amigos. Download de fotos e vídeos, nem tentava. Publicava uma foto no Instagram, sem texto na legenda porque não dava tempo de pensar e escrever direito. Entre enviar e receber mensagens e publicar fotos, no meio do caminho a internet poderia parar, então tinha que ser ágil. Pelo menos esta foi a minha vivência lá, mas sinceramente, não achei ruim. Fora a preocupação em dar notícias aos meus pais e alguns trabalhos que tinha deixado em andamento no Brasil, de modo geral, foi importante viver tudo isso. O fato da internet não ser boa, acabou me ajudando!

Você que chegou até aqui deve estar questionando, que passar uma semana (quase) sem internet foi ‘fácil’ pra mim, porque estava de férias em um país que não possui um serviço de qualidade. Sim, é verdade. Isso facilitou muito, mas neste período, mesmo curto, tentei refletir sobre minha rotina e a real necessidade de usar o celular o tempo todo.

Na campanha inglesa, a instituição RSPH, sugere que se não conseguir ficar os 30 dias sem mídias sociais, pelo menos que reduza o consumo em horários específicos, como durante a escola ou trabalho, nas festas e saídas do final de semana, como também após às 18h, o que ajuda bastante na hora de dormir, evitando a insônia.

Hoje, escrevo este texto já no Brasil e com minha vida normal, internet à vontade e muitos dados compartilhados por dia. Afirmo que sinto falta daquela realidade e da privacidade que a ausência de conexão proporciona. Já não sabia o que era isso, desde então, repenso e procuro limitar mais ao horário do trabalho (tenho uma agência de marketing digital, não há como não usar na minha vida profissional) e, a cada dia me conectar menos, estabelecer horários e viver um cotidiano mais real e menos virtual.

Além de todo aprendizado que uma viagem proporciona, esta além de lugares, amigos, fotos e da experiência de estar em um país socialista, deixou uma reflexão que com certeza, colocarei em prática a partir de agora. Com isso, só posso dizer: GRACIAS CUBA, POR TODO!

Por Priscyla Caldas

Foto da capa retirada de: Pé na Estrada. Fotos abaixo, tiradas por mim, nos passeios pela cidade.


Abaixo algumas imagens da cidade de Havana, em Setembro de 2018. Outras da empresa ETECSA, que monopoliza o serviço de telecomunicações no país (atentar para o aparelho celular que é lançamento lá).

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